sábado, 5 de outubro de 2013

Muspelheim Live Wacken 2007


THERION - Der Mitternachtlöwe


A Coisa no Umbral

A Coisa no Umbral

Morgan não é um literato; na verdade, ele mal consegue falar inglês com algum grau de coerência. É isso o que me faz estranhar as palavras que ele escreveu, embora outros tenham gargalhado.
Ele estava sozinho na noite em que aconteceu. Subitamente uma vontade incontrolável de escrever lhe assomou, e tomando a pena na mão ele escreveu o seguinte:
Meu nome é Howard Phillips. Vivo na Rua College, 66, em Providence, Rhode Island. A 24 de novembro de 1927 – pois não sei sequer em que ano estamos agora – adormeci e sonhei, e desde então tem sido incapaz de despertar.
Meu sonho teve início num pântano úmido e atulhado de juncos que jazia sob um céu cinzento de outono, com um desfiladeiro encapelado de rochas cobertas de liquens elevando-se ao norte. Impelido por alguma motivação obscura, ascendi à uma fenda ou fissura nesse gigantesco precipício, notando enquanto o fazia que as bocas negras de muitos buracos terríveis estendendo-se de ambas as partes até as profundezas do platô de pedra.
Em vários pontos a passagem era coberta pelo chocalhar das partes superiores da fissura estreita; esses lugares sendo excessivamente escuros, e proibindo a percepção de tais buracos que possam ter existido ali. Em tal espaço escuro senti consciência de um singular acesso de pânico, como se alguma sutil e incorpórea emanação do abismo estivesse engolindo meu espírito; mas a escuridão era grande demais para que eu pudesse perceber a fonte de meu alarme.
Concluindo, emergi sobre um platô de rocha musgosa e solo pobre, iluminado por um pálido luar que havia substituído o orbe moribundo do dia. Lançando meus olhos ao redor, não vi objeto vivo; mas estava sensível a uma comoção muito peculiar que vinha muito abaixo de mim, entre os sussurrantes vestígios do pântano pestilento que eu havia acabado de abandonar. Depois de caminhar por uma certa distância, encontrei os trilhos enferrujados de uma ferrovia de rua, e as placas comidas de cupins ainda seguravam o trole em boas condições. Acompanhando esta linha, logo dei com um carro amarelo de vestíbulos de número 1852 – de um tipo de dois vagões comum entre 1900 e 1910. Não estava tinindo, mas evidentemente preparado para partir; o trole estando no fio e o freio aéreo de quando em vez pulsando abaixo do chão. Entrei a bordo e olhei em vão pelo interruptor de luz – notando, enquanto o fazia, a ausência de cabineiro, que assim implicavam a ausência do motorneiro. Então sentei-me num dos bancos cruzados do veículo. Ouvi um farfalhar na grama esparsa à esquerda, e vi as formar escuras de dois homens caminhando ao luar. Tinham os quepes de uma companhia ferroviária, e não pude duvidar de que fossem o condutor e o motorneiro. Então um deles fungou com presteza singular, e elevou o rosto para uivar para a lua. O outro caiu de quatro para correr na direção do carro. Levantei-me de um salto e corri como louco para fora daquele carro e atravessei intermináveis léguas de platô até que a exaustão me forçou a parar: fazendo isto não porque o condutor tivesse caído de quatro, mas porque o rosto do motorneiro era um simples cone branco com um tentáculo vermelho como sangue na ponta…
Eu estava ciente de que apenas sonhava, mas a própria consciência não me foi agradável.
Desde aquela noite pavorosa, tenho rezado apenas para despertar: isso não acontece!
Ao invés disso eu me encontro com um habitante deste terrível mundo dos sonhos! Aquela primeira noite deu lugar à aurora, e caminhei sem rumo pelos pântanos solitários. Quando a noite veio, eu ainda caminhava, esperando acordar. Mas subitamente abri caminho entre os juncos e vi à minha frente o antigo bonde: e, a um lado, uma coisa com rosto em forma de conte levantava sua cabeça e uivava estranhamente para o luar que se derramava!
Tem sido a mesma coisa todo dia. A noite sempre me leva àquele lugar de horror. Tenho tentado não me mover com a chegada da noite, mas devo andar em meu sonambulismo, pois sempre acordo com a coisa de terror uivando à minha frente na pálida luz do luar, e viro-me e fujo como um louco.
Deus! Quando despertarei?
Foi isso o que Morgan escreveu. Eu iria à Rua College 66, em Providence, mas tenho medo do que posso encontrar lá.
H. P. LovecraftTexto originalmente publicado no livro A Tumba… e Outras Histórias
Extraído do site A Vida e Obra de H. P. Lovecraft

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Edgar Allan Poe Biografia

Edgar Allan Poe


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Por Paula Perin dos Santos
Edgar Allan Poe (1809-1849), poeta, crítico e contista, nasceu em Boston, representando uma tendência à parte do movimento geral do Romantismo nos EUA. A tendência dos escritores pelo fantástico, pelo misterioso, pelo macabro. Cultivando na sua obra esses temas, Poe personifica uma das tendências mais marcantes do movimento romântico transplantado da Inglaterra para a América. A vida de Edgar Allan Poe foi marcada pelo sofrimento. Seus pais eram atores de teatro. Depois que Edgar nasceu não se ouviu mais falar de seu pai. A mãe faleceu pouco tempo depois, vítima de tuberculose. Ele e seus irmãos foram adotados por John Allan e sua esposa, prósperos negociantes em Baltimore, onde Poe freqüentou a escola primária. Depois estudou na Inglaterra e, em seguida, na Universidade de Virgínia (EUA).
Desde cedo Poe demonstrou interesse em ser escritor e isso desgostava o Tio Allan, que era um homem de negócios e não se conformava com a determinação do garoto. Isso fez com que Poe crescesse com o sentimento de que o tio o rejeitava.
Publicou seu primeiro livro de poemas pouco depois de abandonar a Universidade. Dedicou-se à carreira militar, sabendo que não poderia viver só de literatura. Mas não se adaptou à disciplina militar e deixou a carreira das armas.
Passou a escrever para viver e se tornou editor de uma conceituada revista de Richmond: a “Mensageiro Literário do Sul”. Foi um período feliz na vida de Edgar. Casou-se com Virgínia, uma prima bem jovem. Pouco depois, perdeu o emprego, passou por dificuldades financeiras, a esposa adoeceu e, apesar de sua dedicação ao cuidar dela, ela faleceu.
Edgar Allan Poe foi o mais romântico dos principais escritores americanos. Em suas obras, ele não se preocupava em abordar os problemas entre o bem e o mal, nem tampouco dar lições de comportamento. Ele acreditava que, se fosse capaz de criar a beleza e tocar a sensibilidade dos seus leitores, já era o bastante.
Os poemas mais famosos de Poe são O corvo e Os sinos. Alguns críticos preferem “Para Helena” e “Annabel Lee”. O poeta acreditava que nada seria mais romântico que um poema sobre a morte de uma mulher bonita. Muitas de suas obras exploram a temática do sofrimento causado pela morte de um amante. Outra característica de sua poesia é a musicalidade, dando a impressão de que o som é mais importante que o sentido.
Edgar Allan Poe é considerado o “criador” do conto policial, mas seu principal mérito está na habilidade com que montava suas histórias. Ele as planejava como um bom arquiteto planeja um edifício, envolvendo o leitor de tal maneira que o conduz “hipnoticamente” ao desfecho da história. Isso revela o dualismo de sua arte e personalidade: de um lado “visionário e idealista”, mergulhado em poemas de tristeza e narrativas de horror e policiais. Um homem de vida conturbada, dominado pelo vício do álcool e excesso de ópio. Por outro lado, era um “artesão exigente”, um escritor que orgulhava de sua técnica e do racionalismo com que criava suas histórias. É essa dualidade que o projeta como um dos mestres da literatura mundial.
Principais Obras:
Contos
O gato preto, Ligéia, O coração delator, A queda da casa de Usher, O poço e o pêndulo, Berenice, O barril de Amontillado, Assassinato de Maria Roget, Os crimes da Rua Morgue, A Máscara da Morte Escarlate, William Wilson, A carta roubada, O Retrato Oval.
Poemas
O Corvo e outros Poemas (1845), Annabel Lee, A cidade do mar, Para Helena.
Fontes
POE, Edgar Allan. Biblioteca Universal Estados Unidos: Contos. São Paulo, Três, 1974, p. 09-15.

O Corvo de Edgar Allan Poe

O CORVO
Tradução de Machado de Assis - 1883
Em certo dia, à hora, à hora
Da meia-noite que apavora,
Eu caindo de sono e exausto de fadiga,
Ao pé de muita lauda antiga,
De uma velha doutrina, agora morta,
Ia pensando, quando ouvi à porta
Do meu quarto um soar devagarinho
E disse estas palavras tais:
"É alguém que me bate à porta de mansinho;
Há de ser isso e nada mais."
Ah! bem me lembro! bem me lembro!
Era no glacial dezembro;
Cada brasa do lar sobre o chão refletia
A sua última agonia.
Eu, ansioso pelo sol, buscava
Sacar daqueles livros que estudava
Repouso (em vão!) à dor esmagadora
Destas saudades imortais
Pela que ora nos céus anjos chamam Lenora,
E que ninguém chamará jamais.
E o rumor triste, vago, brando,
Das cortinas ia acordando
Dentro em meu coração um rumor não sabido
Nunca por ele padecido.
Enfim, por aplacá-lo aqui no peito,
Levantei-me de pronto e: "Com efeito
(Disse) é visita amiga e retardada
Que bate a estas horas tais.
É visita que pede à minha porta entrada:
Há de ser isso e nada mais."
Minhalma então sentiu-se forte;
Não mais vacilo e desta sorte
Falo: "Imploro de vós - ou senhor ou senhora -
Me desculpeis tanta demora.
Mas como eu, precisando de descanso,
Já cochilava, e tão de manso e manso
Batestes, não fui logo prestemente,
Certificar-me que aí estais."
Disse: a porta escancaro, acho a noite somente,
Somente a noite, e nada mais.
Com longo olhar escruto a sombra,
Que me amedronta, que me assombra,
E sonho o que nenhum mortal há já sonhado,
Mas o silêncio amplo e calado,
Calado fica; a quietação quieta:
Só tu, palavra única e dileta,
Lenora, tu como um suspiro escasso,
Da minha triste boca sais;
E o eco, que te ouviu, murmurou-te no espaço;
Foi isso apenas, nada mais.
Entro co'a alma incendiada.
Logo depois outra pancada
Soa um pouco mais tarde; eu, voltando-me a ela:
"Seguramente, há na janela
Alguma coisa que sussurra. Abramos.
Ela, fora o temor, eia, vejamos
A explicação do caso misterioso
Dessas duas pancadas tais.
Devolvamos a paz ao coração medroso.
Obra do vento e nada mais."
Abro a janela e, de repente,
Vejo tumultuosamente
Um nobre Corvo entrar, digno de antigos dias.
Não despendeu em cortesias
Um minuto, um instante. Tinha o aspecto
De um lord ou de uma lady. E pronto e reto
Movendo no ar as suas negras alas.
Acima voa dos portais,
Trepa, no alto da porta, em um busto de Palas;
Trepado fica, e nada mais.
Diante da ave feia e escura,
Naquela rígida postura,
Com o gesto severo - o triste pensamento
Sorriu-me ali por um momento,
E eu disse: "Ó tu que das noturnas plagas
Vens, embora a cabeça nua tragas,
Sem topete, não és ave medrosa,
Dize os teus nomes senhoriais:
Como te chamas tu na grande noite umbrosa?"
E o Corvo disse: "Nunca mais."
Vendo que o pássaro entendia
A pergunta que lhe eu fazia,
Fico atônito, embora a resposta que dera
Dificilmente lha entendera.
Na verdade, jamais homem há visto
Coisa na terra semelhante a isto:
Uma ave negra, friamente posta,
Num busto, acima dos portais,
Ouvir uma pergunta e dizer em resposta
Que este é o seu nome: "Nunca mais."
No entanto, o Corvo solitário
Não teve outro vocabulário,
Como se essa palavra escassa que ali disse
Toda sua alma resumisse.
Nenhuma outra proferiu, nenhuma,
Não chegou a mexer uma só pluma,
Até que eu murmurei: "Perdi outrora
Tantos amigos tão leais!
Perderei também este em regressando a aurora."
E o Corvo disse: "Nunca mais."
Estremeço. A resposta ouvida
É tão exata! é tão cabida!
"Certamente, digo eu, essa é toda a ciência
Que ele trouxe da convivência
De algum mestre infeliz e acabrunhado
Que o implacável destino há castigado
Tão tenaz, tão sem pausa, nem fadiga,
Que dos seus cantos usuais
Só lhe ficou, na amarga e última cantiga,
Esse estribilho: "Nunca mais."
Segunda vez, nesse momento,
Sorriu-me o triste pensamento;
Vou sentar-me defronte ao Corvo magro e rudo;
E mergulhando no veludo
Da poltrona que eu mesmo ali trouxera
Achar procuro a lúgubre quimera.
A alma, o sentido, o pávido segredo
Daquelas sílabas fatais,
Entender o que quis dizer a ave do medo
Grasnando a frase: "Nunca mais."
Assim, posto, devaneando,
Meditando, conjecturando,
Não lhe falava mais; mas se lhe não falava,
Sentia o olhar que me abrasava,
Conjecturando fui, tranqüilo, a gosto,
Com a cabeça no macio encosto,
Onde os raios da lâmpada caiam,
Onde as tranças angelicais
De outra cabeça outrora ali se desparziam,
E agora não se esparzem mais.
Supus então que o ar, mais denso,
Todo se enchia de um incenso.
Obra de serafins que, pelo chão roçando
Do quarto, estavam meneando
Um ligeiro turíbulo invisível;
E eu exclamei então: "Um Deus sensível
Manda repouso à dor que te devora
Destas saudades imortais.
Eia, esquece, eia, olvida essa extinta Lenora."
E o Corvo disse: "Nunca mais."
"Profeta, ou o que quer que sejas!
Ave ou demônio que negrejas!
Profeta sempre, escuta: Ou venhas tu do inferno
Onde reside o mal eterno,
Ou simplesmente náufrago escapado
Venhas do temporal que te há lançado
Nesta casa onde o Horror, o Horror profundo
Tem os seus lares triunfais,
Dize-me: "Existe acaso um bálsamo no mundo?"
E o Corvo disse: "Nunca mais."
"Profeta, ou o que quer que sejas!
Ave ou demônio que negrejas!
Profeta sempre, escuta, atende, escuta, atende!
Por esse céu que além se estende,
Pelo Deus que ambos adoramos, fala,
Dize a esta alma se é dado inda escutá-la
No Éden celeste a virgem que ela chora
Nestes retiros sepulcrais.
Essa que ora nos céus anjos chamam Lenora!"
E o Corvo disse: "Nunca mais."
"Ave ou demônio que negrejas!
Profeta, ou o que quer que sejas!
Cessa, ai, cessa!, clamei, levantando-me, cessa!
Regressa ao temporal, regressa
À tua noite, deixa-me comigo.
Vai-te, não fica no meu casto abrigo
Pluma que lembre essa mentira tua,
Tira-me ao peito essas fatais
Garras que abrindo vão a minha dor já crua."
E o Corvo disse: "Nunca mais."
E o Corvo aí fica; ei-lo trepado
No branco mármore lavrado
Da antiga Palas; ei-lo imutável, ferrenho.
Parece, ao ver-lhe o duro cenho,
Um demônio sonhando. A luz caída
Do lampião sobre a ave aborrecida
No chão espraia a triste sombra; e fora
Daquelas linhas funerais
Que flutuam no chão, a minha alma que chora
Não sai mais, nunca, nunca mais!
ANNABEL LEE
Foi há muitos e muitos anos já,
Num reino de ao pé do mar.
Como sabeis todos, vivia lá
Aquela que eu soube amar;
E vivia sem outro pensamento
Que amar-me e eu a adorar.
Eu era criança e ela era criança,
Neste reino ao pé do mar;
Mas o nosso amor era mais que amor
O meu e o dela a amar;
Um amor que os anjos do céu vieram
a ambos nós invejar.
E foi esta a razão por que, há muitos anos,
Neste reino ao pé do mar,
Um vento saiu duma nuvem, gelando
A linda que eu soube amar;
E o seu parente fidalgo veio
De longe a me a tirar,
Para a fechar num sepulcro
Neste reino ao pé do mar.
E os anjos, menos felizes no céu,
Ainda a nos invejar...
Sim, foi essa a razão (como sabem todos,
Neste reino ao pé do mar)
Que o vento saiu da nuvem de noite
Gelando e matando a que eu soube amar.
Mas o nosso amor era mais que o amor
De muitos mais velhos a amar,
De muitos de mais meditar,
E nem os anjos do céu lá em cima,
Nem demônios debaixo do mar
Poderão separar a minha alma da alma
Da linda que eu soube amar.
Porque os luares tristonhos só me trazem sonhos
Da linda que eu soube amar;
E as estrelas nos ares só me lembram olhares
Da linda que eu soube amar;
E assim 'stou deitado toda a noite ao lado
Do meu anjo, meu anjo, meu sonho e meu fado,
No sepulcro ao pé do mar,
Ao pé do murmúrio do mar.
* Traduzido de Annabel Lee, de Edgard Allan Poe, por Fernando Pessoa,
ritmicamente conforme com o original.
LINHAS SOBRE A CERVEJA
Cheio de espuma e âmbar misturados
Esvaziarei este copo novamente
Visões as mais hilariantes embarafustam
Pela alcova de meu cérebro
Pensamentos os mais curiosos fantasias as mais extravagantes
Ganham vida e se dissipam;
O que me importa o passar das horas?
Hoje estou tomando cerveja.
ELDORADO
Gentil, faceiro,
um cavaleiro,
sob sol e sombreado,
seguiu avante,
cantarolante,
em busca do Eldorado.
Mas o andarilho
ficou tão velho,
no âmago assombrado,
por não achar
nenhum lugar
assim como Eldorado.
E, enfim diante
de sombra errante,
parou, quando esgotado
e arguiu-lhe "onde,
sombra, se esconde
a terra de Eldorado?"
"Sobre as montanhas
da lua e entranhas
do Vale Mal-Assombrado,
vá com coragem,"
disse a miragem,
"se procuras o Eldorado".
Contos
O BARRIL DE AMONTILLADO
Está bem - disse eu, guardando outra vez a ferramenta debaixo da capa e
oferecendo-lhe o braço. Apoiou-se pesadamente em mim. Continuamos nosso
caminho, em busca do Amontillado. Passamos através de uma série de baixas
abóbadas, descemos, avançamos ainda, tornamos a descer e chegamos,
afinal, a uma profunda cripta, cujo ar, rarefeito, fazia com que nossas velas
bruxuleassem, ao invés de arder normalmente.
Na extremidade mais distante da cripta aparecia uma outra, menos espaçosa.
Despojos humanos empilhavam-se ao longo de seus muros, até o alto das
abóbadas, à maneira das grandes catacumbas de Paris. Três dos lados dessa
cripta eram ainda adornados dessa maneira. Do quarto, os ossos haviam sido
retirados e jaziam espalhados pelo chão, formando, num dos cantos, um monte
de certa altura. Dentro da parede, que, com a remoção dos ossos, ficara
exposta, via-se ainda outra cripta ou recinto interior, de uns quatro pés de
profundidade, três de largura e seis ou sete de altura. Não parecia haver sido
construída para qualquer uso determinado, mas constituir apenas um intervalo
entre os dois enormes pilares que sustinham a cúpula das catacumbas, tendo
por fundo uma das paredes circundantes de sólido granito.
Foi em vão que Fortunato, erguendo sua vela bruxuleante, procurou divisar a
profundidade daquele recinto. A luz, fraca, não nos permitia ver o fundo.
- Continue - disse-lhe eu. - O Amontillado está aí dentro. Quanto a Luchesi . . .
- É um ignorante - interrompeu o meu amigo, enquanto avançava com passo
vacilante, seguido imediatamente por mim.
Num momento, chegou ao fundo do nicho e, vendo 0 caminho interrompido
pela rocha, deteve-se, estupidamente perplexo. Um momento após, eu já o
havia acorrentado ao granito, pois que, em sua superfície, havia duas argolas
de ferro, separadas uma da outra, horizontalmente, por um espaço de cerca de
dois pés. De uma delas pendia uma corrente; da outra, um cadeado. Lançar a
corrente em torno de sua cintura, para prendê-lo, foi coisa de segundos. Ele
estava demasiado atônito para oferecer qualquer resistência. Retirando a
chave, recuei alguns passos.
- Passe a mão pela parede - disse-lhe eu. - Não poderá deixar de sentir o
salitre. Está, com efeito, muito úmida. Permita-me, ainda uma vez, que lhe
implore para voltar. Não? Então, positivamente, tenho de deixá-lo. Mas,
primeiro, devo prestar-lhe todos os pequenos obséquios ao meu alcance.
- O Amontillado! - exclamou o meu amigo, que ainda não se refizera de seu
assombro.
- É verdade - respondi -, o Amontillado.
E, dizendo essas palavras, pus-me a trabalhar entre a pilha de ossos a que já
me referi. Jogando-os para o lado, deparei logo com uma certa quantidade de
pedras de construção e argamassa. Com este material e com a ajuda de minha
colher de pedreiro, comecei ativamente a tapar a entrada do nicho.
Mal assentara a primeira fileira de minha obra de pedreiro, quando descobri
que a embriaguez de Fortunato havia, em grande parte, se dissipado. O
primeiro indício que tive disso foi um lamentoso grito, vindo do fundo do nicho.
Não era o grito de um homem embriagado. Depois, houve um longo e
obstinado silêncio. Coloquei a segunda, a terceira e a quarta fileiras. Ouvi,
então, as furiosas sacudidas da corrente. O ruído prolongou-se por alguns
minutos, durante os quais, para deleitar-me com ele, interrompi o meu trabalho
e sentei-me sobre os ossos. Quando, por fim, o ruído cessou, apanhei de novo
a colher de pedreiro e acabei de colocar, sem interrupção, a quinta, a sexta e a
sétima fileiras. A parede me chegava, agora, até a altura do peito. Fiz uma nova
pausa e, segurando a vela por cima da obra que havia executado, dirigi a fraca
luz sobre a figura que se achava no interior.
Uma sucessão de gritos altos e agudos irrompeu, de repente, da garganta do
vulto acorrentado, e pareceu impelir-me violentamente para trás. Durante breve
instante, hesitei... tremi. Saquei de minha espada e pus-me a desferir golpes no
interior do nicho; mas um momento de reflexão bastou para tranqüilizar-me.
Coloquei a mão sobre a parede maciça da catacumba e senti-me satisfeito.
Tornei a aproximar-me da parede e respondi aos gritos daquele que clamava.
Repeti-os, acompanhei-os e os venci em volume e em força. Fiz isso, e o que
gritava acabou por silenciar.
Já era meia-noite, a minha tarefa chegava ao fim. Completara a oitava, a nona
e a décima fileiras. Havia terminado quase toda a décima primeira - e restava
apenas uma pedra a ser colocada e rebocada em seu lugar. Ergui-a com
grande esforço, pois que pesava muito, e coloquei-a, em parte, na posição a
que se destinava. Mas, então, saiu do nicho um riso abafado que me pôs os
cabelos em pé. Seguiu-se-lhe uma voz triste, que tive dificuldade em
reconhecer como sendo a do nobre Fortunato. A voz dizia:
- Ah! ah! ah! . . . eh! eh! eh! . . . Esta é uma boa piada... uma excelente piada!
Vamos rir muito no palazzo por causa disso . . . ah! ah! ah! . . . por causa do
nosso vinho... ah! ah! ah!
- O Amontillado! - disse eu.
- Ah! ah! ah! . . . sim, sim . . . o Amontillado. Mas não está ficando tarde? Não
estarão nos esperando no palácio. . . a Sra. Fortunato e os outros? Vamos
embora.
- Sim - respondi -, vamos embora. - Pelo amor de Deus, Montresor!
- Sim - respondi -, pelo amor de Deus!
Mas esperei em vão qualquer resposta a estas palavras. Impacientei-me.
Gritei, alto:
- Fortunato!
Nenhuma resposta. Tornei a gritar:
- Fortunato!
Ainda agora, nenhuma resposta. Introduzi uma vela pelo orifício que restava e
deixei-a cair dentro do nicho. Chegou até mim, como resposta, apenas um
tilintar de guizos. Senti o coração opresso, sem dúvida devido à umidade das
catacumbas. Apressei-me para terminar o meu trabalho. Com esforço, coloquei
em seu lugar a última pedra - e cobri-a com argamassa. De encontro à nova
parede, tornei a erguer a antiga muralha de ossos. Durante meio século, mortal
algum os perturbou. In pace requiescat!

LeMulgeton: Goetia e a Tradição Estelar

LeMulgeton: Goetia e a Tradição Estelar 

 

do site morte súbita: 

http://www.mortesubita.org/blog/lemulgeton-goetia-a-tradicao-estelar/view 

Contando as estrelas desde 1996
LeMulgeton: Goetia e a Tradição Estelar
LeMulgeton: Goetia and the Stellar Tradition
A maioria dos leitores do 'Ars Goetia', para não dizer todos, estão muito mais interessados no que eles podem conseguir usando o sistema do que em saber suas origens. Mas ignorar a origem de qualquer coisa é limitar o seu potencial. Como é que goetia chegou aos nossos dias? Quem ou o que são os 72 demônios apresentados? Serão mesmo demônios? E porque são 72? O que as representações dos espíritos dizem sobre eles? Muitas questões permanecem abertas e o objetivo do livro 'LeMulgeton: Goetia and the Stellar Tradition' é justamente apontar o caminho para algumas respostas.

A obra de Leo M. Holmes foi lançada recentemente na europa, e por enquanto apenas em inglês pela editora Fall of Man. A além de ser um trabalho editorial primoroso, o livro é de um conteúdo bastante inovador. Nela o autor relaciona o Lemegeton com o Mul.Apin (um compêndio babilônico de astronomia e astrologia) e abre novas possibilidades de exploração dos sistema ao buscar uma relação mítico-astronômica atribuindo para cada ser goéticos uma constelação de origem suméria (incluindo estrelas isoladas e planetas). Seguindo a ordem com os que os demônios são apresentados originalmente o autor analisa a similaridades de nomes com as constelações babilônicas, as descrições e atribuições mitológicas similares entre as duas fontes e mesmo os nomes modernos das constelações, sugerindo uma insuspeita origem estelar para estas entidades.

Estas associações não são feitas de maneira dogmática, mas sim como uma pragmática forma de trabalho capaz de estimular os magistas contemporâneos no desenvolvimento de suas práticas e na ampliação de seus conhecimentos. Tanto o Mul.Apin como o Lemegeton são mapas ancestrais cuja intenção é preservar um conhecimento que provavelmente é muito mais antigo do que o próprio ser humano. O objetivo do 'LeMulgeton: Goetia and the Stellar Tradition' não é outro senão reestabelecer uma conexão a muito perdida com os Deuses Mais Antigos em suas mais profundas natureza.

Índice da obra:

Foreword
The Rejected Gods
The Seventy-two fold Key <- br="" dispon="" download="" para="" vel=""> Godhunt
The Tarot
Later Middle Eastern Traditions and their Influences
The Fixed Behenian Stars
Crowley, Grant, Lovecraft and Others
The Stellar Kabbalah
Prospects
Afterword
Appendix (Planisphere)

quinta-feira, 19 de setembro de 2013

The Blood Of Kingu

The Blood Of Kingu

Collect the blood of Kingu from the great old sea
And arrogate the primeval waters
Inside your veins, the power of the demon flow
Have you ever searched for your descent?

Gaze into your soul, we are the children of the ancient ones
On the thin facade we are the kindred of the benign gods

Take up and read the tables of your destiny
They hang around the neck of Kingu
Prepare the war between gods deep inside your soul
You are the one to fight in this war!

[Pre-Chorus]
March for war in your soul. Hail!
Demon Kingu rise, rise, rise from the void. Hail!
Kingu rules the horned dragons, Ugallu, fishmen,
Mushussu, umu, bulls, frogs, scorpions, dogs...Kingu rules the void!

[Chorus]
Kingu is the blood of man drawn off from this early war
In your veins you find the strength from the demon's heritage

Chaotic waters covered every part of Earth
The old gods split it like shellfish
But in the shells the blood of chaos still remain
Mother Habur suckle her children

[Pre-Chorus]
March for war in your soul. Hail!
Demon Kingu rise, rise, rise from the void. Hail!
Kingu rules the horned dragons, Ugallu, fishmen,
Mushussu, umu, bulls, frogs, scorpions, dogs... Kingu rules the void!

[Chorus]
Kingu is the blood of man, drawn off from this early war
In your veins, you find the strength from the demon's heritage

[Bass]
Kingu, general, host of the chaos, fighting for Tiamat, bearer of sky and earth

[Soprano]
Kingu, the mighty master, ruling eleven demons
Kingu, your blood is running insinde the heart of mankind

The ancient demons, they will refill us
The ancient demons, they will refill us.

O Sangue de Kingu

Colete o sangue de Kingu do grande e velho mar
E se aproprie das águas primordiais
Dentro de suas veias, flui a força do demônio
Alguma vez você já procurou por sua ascendência?

Olhe para dentro de sua alma, nós somos filhos dos demônios ancestrais
Na fina camada, nós somos parentes dos deuses benignos

Apanhe e leia as tábuas de seu destino
Elas estão penduradas ao redor do pescoço de Kingu
Prepare a guerra entre os deuses no fundo de sua alma
Você é o único a lutar nessa guerra!

[Pre-Refrão]
Marche para guerra em sua alma. Salve!
Demônio Kingu se levanta, se levanta, se levanta do vazio. Salve!
Kingu domina os dragões com chifres, Ugallu, pescadores,
Mushussu, umu, touros, sapos, escorpiões, cães ... Kingu domina o vazio!

[Refrão]
Kingu é o sangue do homem retirado desta guerra inicial
Em suas veias você encontrará a força da herança demôniaca

Águas caóticas cobriram todas as partes da Terra
Os deuses antigos a dividiram como um marisco
Mas nas conchas, o sangue de caos ainda permanece
Mãe Habur amamenta seus filhos

[Pré-Refrão]
Marche para guerra em sua alma. Salve!
Demônio Kingu se levanta, se levanta, se levanta do vazio. Salve!
Kingu domina os dragões com chifres, Ugallu, pescadores,
Mushussu, umu, touros, sapos, escorpiões, cães ... Kingu domina o vazio!

[Refrão]
Kingu é o sangue do homem retirado desta guerra inicial
Em suas veias você encontrará a força da herança demôniaca

[Tenor]
Kingu, general, hospedeiro do caos, lutando por Tiamat, dona do céu e da terra

[Soprano]
Kingu, o poderoso mestre, regendo onze demônios
Kingu, seu sangue corre dentro do coração da humanidade

Os demônios ancestrais, eles irão nos preencher
Os demônios ancestrais, eles irão nos preencher